terça-feira, 16 de novembro de 2010

Aventura e Emoção ao Alcance de todos

Artigo vencedor CONCURSO DE ARTIGOS DA AGENDA DO PORTADOR DE EFICIÊNCIA 2011

Amanhece o dia ensolarado, com um vento fresco que vem da Serra. É hora de arrumar a mochila e partir para uma aventura no lugar mais improvável: a própria cidade. Na bagagem, além de água, um cajado, chapéu, protetor solar e frutas, vai uma boa dose de coragem, determinação, disposição e ousadia. O destino é a Serra da Paulista. Primeiro dirigindo o próprio carro e depois a pé no meio da mata nativa, ouvindo o canto dos pássaros e o som indeterminado de algum animal silvestre que nos acompanha, mas não se aproxima. É possível ver suas pegadas na areia... É melhor não arriscar... Nunca se sabe... Pode ser um cão ou uma onça.

No grupo vão amigos fraternos, um guia especializado e uma fisioterapeuta. Na mata, descobrindo cores, luzes, cheios, texturas e sensações absolutamente envolventes. Dá vontade de continuar sem parar até não sei onde.

Se foram ou não estas as sensações vividas por Raquel, não sabemos, mas que elas são muito freqüentes, isso são.

Segundo Raquel Fuin, 28, mauaense que mora em São João há 17 anos, “São João é uma cidade turística em potencial. Conta com belezas naturais preciosas e acessíveis que são verdadeiros tesouros”.

Raquel já fez diversas caminhadas na mata (trekkings, como são chamadas no turismo de aventura),acompanhada de Rafael e Carol, da Prata Expedições (empresa receptiva com sede em São João da Boa Vista, parceira da CTUR e da Caminhada da Lua Cheia). “Estes passeios na Serra devem ser divulgados desde que, tanto turistas como guias, estejam realmente envolvidos na preservação dessas belezas e exploração consciente do potencial turístico que a Serra tem a oferecer. A partir de práticas educativas sobre conservação ambiental e iniciativas que permitam à população conhecer e desfrutar dessas atrações, o turismo de São João só tem a crescer”.

Raquel costuma dizer que só conheceu a “Boa Vista” de São João, quando esteve na “maravilhosa” Serra da Paulista, “um lugar de uma energia incrível, beleza, tranqüilidade e facilidade de acesso”. Entre as atividades preferidas da Psicopedagoga estão as trilhas na mata, visita a cachoeiras, participação da Caminhada da Lua Cheia e alimentação nos restaurantes rurais. Para ela, um dos roteiros mais interessantes é pela trilha do Circuito Fortaleza, pois, além do contato com a natureza, o turista pode tocar em uma figueira de aproximadamente 250 anos e terminar o passeio com um banho na Cachoeira do Cipó.

Questionada sobre o que pensa da vida, Raquel, uma turista muito especial, disse que para ela é um grande presente de Deus, pois Ele é sempre o guia dos seus passos. Diz ainda que acredita que “viver é passar por alegrias e dificuldade e que amar ao próximo e a si mesmo é aprender e errar, é perseverar e acreditar que cada aurora é a certeza de uma nova chance”. Ela crê que a vida é HOJE e que é na simplicidade que encontra o que a vida tem de melhor: a família, os amigos, a natureza e tudo de bom que possa conhecer.

Entre seus planos para o futuro, estão “fazer muitas outras trilhas nos caminhos de São João e região, visitar muitas cachoeiras, fazer muito rapel, viajar e estar sempre em movimento.RS”. (O riso é dela!).

Raquel Nunes Fuin tem Esclerose Múltipla. Para ela, no turismo, o essencial para pessoas com deficiência é a acessibilidade. Em São João o turismo conta com pessoas envolvidas com a convivência da diversidade humana, no respeito às particularidades de cada pessoa, seja no seu ritmo, seja na sua deficiência.

Esclerose Múltipla: superando limites

Psicopedagoga, pós-graduada e “Psicopedagogia Clínica e Institucional” e em “Práticas de Letramento e Alfabetização”, Raquel começou a ter alguns sintomas há 12 anos, quando ainda cursava o Ensino Médio. “Até chegar ao tratamento específico foram mais de 9 anos entre internações, tratamentos, reabilitações físicas e viagens em busca de orientação médica. Um processo bastante desgastante, mas minha família manteve-se unida na confiança de que um dia a resposta chegaria. Hoje sigo uma rigorosa rotina de tratamento, no uso de injeções diárias e fisioterapia constante”, conta.

Em paralelo ao tratamento, a Psicopedagoga dedica uma parte do tempo às artes e, eventualmente, participa das atividades de ecoturismo em São João e região. “Procuro sempre manter atividades que estejam associadas ao bem-estar, como literatura, poesia, música, pintura, artesanato. Creio que estar em movimento é fundamental e, ainda que não seja possível realizar todas as tarefas almejadas, há muitas coisas boas que são possíveis de serem realizadas”, declara.

Raquel revela que por se tratar de uma doença neurológica crônica e progressiva, constantemente se depara com atitudes de espanto ou medo de algumas pessoas quando fala que tem EM. “Há muitos mitos e desconhecimento sobre a real ação da doença. Já lidei com situações onde o fato de ter EM mostrou-se como impedimento para permanecer no mercado de trabalho. Questões como „dá pra você trabalhar?‟ ou „e se vier a crise como faremos?‟. Costumo dizer que a esclerose múltipla é a „doença do imprevisível‟. Essa imprevisibilidade é sua característica mais marcante. Temos como manter uma boa qualidade de vida com o tratamento medicamentoso, fisioterápico e acompanhamento constante de uma boa equipe médica, porém, não há garantias sobre como cada portador vai acordar na manhã seguinte, ou mesmo como vai terminar o dia quanto aos seus movimentos, sua visão, sua voz ou qualquer outra função. Algumas alterações são passageiras e brevemente desaparecem assim como surgiram, outras se instalam ora lentamente, ora de uma única vez. Cada portador é único. E essa flutuação de sintomas com certeza atrapalha aqueles que querem se manter ativos e trabalhando, e muitas vezes isso acontece não pela incapacidade da pessoa de estar ativa, mas pelo modo como o mercado de trabalho exige que essa pessoa se comporte, cumpra sua rotina e as determinações que seu emprego exige. As pessoas temem o desconhecido e de atitudes como essa surge o preconceito e a segregação”.

Às pessoas com deficiência, com relação à vida social, ao lazer e ao esporte radical, Raquel deixa a seguinte reflexão: “lidar com as limitações não é fácil. O que posso dizer é que, ainda que não seja possível realizar uma atividade por completo, vale a pena tentar chegar ao máximo que se alcança. Não se prive de sua vida social por seus temores internos ou daqueles que o rodeiam. Arrisque. Saia de casa, busque amigos e companhia para praticar alguma atividade. Sozinho tudo fica mais difícil, mas, com apoio e incentivo é possível ir além. Tenha contato com a natureza. Contrate um guia para te levar a um roteiro interessante, experimente novas sensações. Não se prive de viver. Faça de sua bengala, sua cadeira de rodas, sua ausência de visão ou qualquer que seja sua deficiência um modo de seguir adiante. Aqui em São João há muitas opções de acesso a essas aventuras. Aproveite, aprecie e confie que será especial. Faça tudo no seu ritmo e com certeza a natureza te fará se sentir em uma sintonia sem igual”.

“Eu confio que se puder ser um instrumento para que outras pessoas percebam que muitas vezes a limitação está na mente, será ótimo! Confio sempre nisso”. (Raquel Fuin).

Autoras:
Telma Salles Corulli –Jornalista e coordenadora da CTUR/ACE
E-mail: sallescorulli@hotmail.com
e
Nayara Maria Vasconcelos - Jornalista Revista ATUA/ACE
E-mail nayvasconcelos@yahoo.com.br
São João da Boa Vista - SP

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